Enviado por: Daniela Reichembach
Autor do texto: José Fábio Rodrigues Maciel
O Código Civil Francês de 1804 - Histórico
O Código Civil Francês, de 21 de março de 1804, ficou conhecido, a partir de 1807, como "Código Napoleão", devido ao fato de ter sido editado durante o consulado de Bonaparte. Após o Congresso de Viena, em 1815, voltou a ser conhecido apenas como "Código Civil", mas a adesão dos juristas ao título personalista, principalmente no chamado "Novo Mundo", fez que um Decreto de 1852 restabelecesse a denominação oficial de Código Napoleão, em homenagem ao seu idealizador e artífice. Foi a partir do momento histórico conhecido como golpe do 18 Brumário (9 de novembro de 1799) que foi instalado o Consulado na França, com três membros, sendo Napoleão declarado o primeiro Cônsul. No ano seguinte instalou-se uma comissão para elaborar o Projeto do Código Civil, que devia ter linguagem clara e acessível aos cidadãos franceses.
Sob o comando de Napoleão, que presidiu mais da metade de cerca de cem sessões de aprovação da Comissão de Legislação do Conselho de Estado, encarregada de elaborar o Projeto, o Código Civil Francês foi redigido por Tronchet, Presidente da Cour de Cassation, antigo e respeitado processualista, Portalis, membro do Tribunal de Presas, advogado e respeitável jurista, Bigot de Préameneu, Comissário do Governo junto ao Tribunal de Cassation e Maleville, Juiz da Cour de Cassation. Após três meses de exaustivo trabalho, o texto foi submetido ao Conselho de Estado, conforme determinava a Constituição do Ano VIII (o calendário foi zerado a partir da Revolução Francesa), sob o controle de Cambaceres, segundo Cônsul. Concebido como um conjunto de leis que regulamentavam as relações entre os cidadãos, o Código estribou-se em três pilares que caracterizavam a burguesia surgida da Revolução Francesa: a propriedade, o contrato e a responsabilidade civil. A propriedade foi transformada em direito inviolável e sagrado, sendo à época apresentada por Portalis como "a alma universal da legislação". Portador da visão de mundo do final do século XVIII e início do XIX, ou seja, trazendo em seu bojo as idéias presentes no Iluminismo e na Revolução Francesa, com total ligação à queda do Ancien Regime e à construção da sociedade liberal, até hoje o Código Napoleão revela surpreendente modernidade e adaptabilidade, permitindo acompanhar a transformação da sociedade francesa que, em dois séculos, passou de uma organização patriarcal à afirmação da igualdade entre homens e mulheres. Em vigência até hoje, serviu e serve de referência para incontáveis legisladores desde o século XIX.
Permanecendo praticamente inalterado por mais de um século, com exceção da fortíssima restrição ao divórcio em 1816, o Código de 1804 foi inovador: suprimiu o direito de primogenitura em relação às sucessões, admitiu a possibilidade de divórcio em casos de adultério e eliminou o que ainda restava do feudalismo em relação ao direito das coisas, com o intuito de eliminar totalmente os usos e costumes feudais ainda presentes na sociedade francesa. Adotou o sistema do registro civil laico, em consonância com o Estado laico que surgiu após a Revolução de 1789. Enfatizou-se que o legislador não deve perder de vista que as leis são elaboradas para os homens, e não os homens para as leis e que estas devem ser adaptadas ao caráter, aos hábitos, à situação do povo, para o qual elas se destinam.
As grandes mudanças levadas a cabo só aconteceram a partir de 1964; necessárias devido às transformações da sociedade francesa durante esses mais de 200 anos. Mesmo assim, dos atuais 2302 artigos, 1200 continuam em vigência com a redação original. Para constatar a força do Código Civil francês vale destacar que nesse período a França teve mais de dez constituições, sendo a de 4 de outubro de 1958, que regula o funcionamento das instituições da Quinta República, a última delas. Mesmo com toda a transformação constitucional o Código foi sempre recepcionado pelas novas constituições. Adquiriu, com isso, a chancela de referência jurídica para o povo francês e desfruta desde tempos remotos de enorme prestígio internacional.
O Código de 1804 foi o responsável pela unificação da legislação civil e pelo sepultamento do pluralismo jurídico, já que admitia apenas um único direito vigente para qualquer membro da sociedade. Ademais, fazendo parte e sendo o principal código da codificação capitaneada por Napoleão Bonaparte, é um marco na positivação do direito e no estudo deste como sistema, em que não se admitem lacunas, devido ao fato de abranger de forma clara e objetiva, pelo menos no entendimento dos legisladores e aplicadores da época, todo o direito vigente na sociedade francesa. Além disso, ganha envergadura o princípio da univocidade do direito, em que se destaca a postura de defender a existência de apenas um sistema jurídico, justamente aquele imposto pela ordem estatal. O legislador francês utilizou-se de tipos normativos minuciosos, raramente utilizando-se de conceitos vagos ou abertos, o que limitava enormemente a atividade jurisdicional do juiz. Surgiu, com isso, a Escola da Exegese, que deu ao legislador todo o cometimento possível, o que limitou a possibilidade interpretativa dos juízes, ao restringir esta ao aspecto gramatical e sistemático das disposições do Código.
Referência:
O Código Civil Francês de 1804 - Histórico
O Código Civil Francês, de 21 de março de 1804, ficou conhecido, a partir de 1807, como "Código Napoleão", devido ao fato de ter sido editado durante o consulado de Bonaparte. Após o Congresso de Viena, em 1815, voltou a ser conhecido apenas como "Código Civil", mas a adesão dos juristas ao título personalista, principalmente no chamado "Novo Mundo", fez que um Decreto de 1852 restabelecesse a denominação oficial de Código Napoleão, em homenagem ao seu idealizador e artífice. Foi a partir do momento histórico conhecido como golpe do 18 Brumário (9 de novembro de 1799) que foi instalado o Consulado na França, com três membros, sendo Napoleão declarado o primeiro Cônsul. No ano seguinte instalou-se uma comissão para elaborar o Projeto do Código Civil, que devia ter linguagem clara e acessível aos cidadãos franceses.
Sob o comando de Napoleão, que presidiu mais da metade de cerca de cem sessões de aprovação da Comissão de Legislação do Conselho de Estado, encarregada de elaborar o Projeto, o Código Civil Francês foi redigido por Tronchet, Presidente da Cour de Cassation, antigo e respeitado processualista, Portalis, membro do Tribunal de Presas, advogado e respeitável jurista, Bigot de Préameneu, Comissário do Governo junto ao Tribunal de Cassation e Maleville, Juiz da Cour de Cassation. Após três meses de exaustivo trabalho, o texto foi submetido ao Conselho de Estado, conforme determinava a Constituição do Ano VIII (o calendário foi zerado a partir da Revolução Francesa), sob o controle de Cambaceres, segundo Cônsul. Concebido como um conjunto de leis que regulamentavam as relações entre os cidadãos, o Código estribou-se em três pilares que caracterizavam a burguesia surgida da Revolução Francesa: a propriedade, o contrato e a responsabilidade civil. A propriedade foi transformada em direito inviolável e sagrado, sendo à época apresentada por Portalis como "a alma universal da legislação". Portador da visão de mundo do final do século XVIII e início do XIX, ou seja, trazendo em seu bojo as idéias presentes no Iluminismo e na Revolução Francesa, com total ligação à queda do Ancien Regime e à construção da sociedade liberal, até hoje o Código Napoleão revela surpreendente modernidade e adaptabilidade, permitindo acompanhar a transformação da sociedade francesa que, em dois séculos, passou de uma organização patriarcal à afirmação da igualdade entre homens e mulheres. Em vigência até hoje, serviu e serve de referência para incontáveis legisladores desde o século XIX.
Permanecendo praticamente inalterado por mais de um século, com exceção da fortíssima restrição ao divórcio em 1816, o Código de 1804 foi inovador: suprimiu o direito de primogenitura em relação às sucessões, admitiu a possibilidade de divórcio em casos de adultério e eliminou o que ainda restava do feudalismo em relação ao direito das coisas, com o intuito de eliminar totalmente os usos e costumes feudais ainda presentes na sociedade francesa. Adotou o sistema do registro civil laico, em consonância com o Estado laico que surgiu após a Revolução de 1789. Enfatizou-se que o legislador não deve perder de vista que as leis são elaboradas para os homens, e não os homens para as leis e que estas devem ser adaptadas ao caráter, aos hábitos, à situação do povo, para o qual elas se destinam.
As grandes mudanças levadas a cabo só aconteceram a partir de 1964; necessárias devido às transformações da sociedade francesa durante esses mais de 200 anos. Mesmo assim, dos atuais 2302 artigos, 1200 continuam em vigência com a redação original. Para constatar a força do Código Civil francês vale destacar que nesse período a França teve mais de dez constituições, sendo a de 4 de outubro de 1958, que regula o funcionamento das instituições da Quinta República, a última delas. Mesmo com toda a transformação constitucional o Código foi sempre recepcionado pelas novas constituições. Adquiriu, com isso, a chancela de referência jurídica para o povo francês e desfruta desde tempos remotos de enorme prestígio internacional.
O Código de 1804 foi o responsável pela unificação da legislação civil e pelo sepultamento do pluralismo jurídico, já que admitia apenas um único direito vigente para qualquer membro da sociedade. Ademais, fazendo parte e sendo o principal código da codificação capitaneada por Napoleão Bonaparte, é um marco na positivação do direito e no estudo deste como sistema, em que não se admitem lacunas, devido ao fato de abranger de forma clara e objetiva, pelo menos no entendimento dos legisladores e aplicadores da época, todo o direito vigente na sociedade francesa. Além disso, ganha envergadura o princípio da univocidade do direito, em que se destaca a postura de defender a existência de apenas um sistema jurídico, justamente aquele imposto pela ordem estatal. O legislador francês utilizou-se de tipos normativos minuciosos, raramente utilizando-se de conceitos vagos ou abertos, o que limitava enormemente a atividade jurisdicional do juiz. Surgiu, com isso, a Escola da Exegese, que deu ao legislador todo o cometimento possível, o que limitou a possibilidade interpretativa dos juízes, ao restringir esta ao aspecto gramatical e sistemático das disposições do Código.
Referência:
MACIEL, José Fábio Rodrigues. O Código Civil Francês de 1804 - Histórico. In.: Jornal Carta Forense. 1.12.2006. Disponível em: <http://www.cartaforense.com.br/conteudo/colunas/o-codigo-civil-frances-de-1804---historico/562>.
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