terça-feira, 16 de junho de 2015

As primeiras faculdades de Direito do Brasil

Enviado por: Mariana de Araújo Barroco

Em meio aos nossos estudos em âmbito global, entender como o ensino jurídico foi implementado no Brasil, além de ser de extrema importância para nós estudantes de direito, é o tipo de curiosidade que instiga ainda mais nossa trajetória jurídica.

Autoria de: Rodrigo Benedet Naspolini


1. Introdução

As primeiras faculdades de Direito surgidas no Brasil foram institucionalizadas pela aprovação do projeto de 31 de Agosto de 1826 – convertido em lei em 11 de Agosto de 1827 – que primava pela instalação de dois centros dedicados ao estudo jurídico em nosso país. Desta forma, São Paulo e Olinda foram as localidades escolhidas para abrigar esta nova vanguarda no ensino, devido principalmente à situação geográfica – uma para atender o sul e outra para suprir às necessidades dos habitantes do norte do Brasil.

A ideia de instalar no país institutos de educação superior em Direito veio primordialmente da lógica que marcou a independência do Brasil junto a Portugal, em 1822, de autonomia nacional, de construção de uma identidade como tal. Em busca de nova lei e consciência, pretendia-se formar uma elite intelectual independente das escolas portuguesas e francesas.

Os primeiros cursos, iniciados em 1828, atendiam as necessidades dos alunos e docentes, porém o prestígio buscado por ambos não era o academicismo, mas sim as simbólicas possibilidades políticas futuras do bacharelismo. Outro problema insurgente logo no princípio das atividades acadêmicas no Brasil foi o alto índice de desrespeito dos alunos, falta de habilidade autoritária dos mestres e outros agravantes oriundos do pouco costume ao estudo e reflexão entre os clientes.

De forma geral, podemos dizer que a escola de São Paulo tendia de forma mais ampla ao modelo liberal da política, enquanto a de Pernambuco – que em 1854, transferiu-se de Olinda para Recife – era adepta ao perfil doutrinador, analisando de forma mais sócio-racial e neodarwinista o Direito.

Passaremos a analisar de forma mais detalhada estas duas faculdades pioneiras do Direito no Brasil, seus pensamentos, publicações, problemas e contribuições; iniciando com a Faculdade de Direito do Recife. 

2. Faculdade de Direito do Recife

Uma das localidades escolhidas pelo novo Império para sediar o pioneirismo jurídico no nosso país foi à província de Pernambuco. O motivo para esta escolha pode ter sido de ordem paliativa – pois esta província era muito revolucionária e opunha-se à monarquia, em preferência à república. O curso se instala no mosteiro de São Bento, em Olinda, e a ordem religiosa segue a tendência do bacharelismo pernambucano.

Logo no princípio, o objetivo de autonomia intelectual nacional foi paradoxalmente abandonado, uma vez que as ideias, os professores e até alunos eram vindos da ex-metrópole lusitana. Aceitava livremente e até mesmo facilitava a vinda de estudantes que não eram aptos à Faculdade de Coimbra e de Paris. A estrutura do curso era uma cópia do ensino jurídico de Coimbra, sendo que até os hábitos dos frequentadores eram os mesmos. Por mais que pareça estranhamente descomunal no Nordeste do Brasil, os alunos usavam “chapéu alto, fraque e sobrecasaca preta” (p. 144).

Os primeiros tempos do Direito pernambucano em Olinda foram marcados pela falta de profissionais capacitados, influência nítida da Igreja e problemas estruturais sérios. Alguns alunos e professores moravam em Recife, o que dificultava a assiduidade de ambos os grupos; outros estavam ocupados com cargos políticos e não podiam exercer o ofício de docência.

Pouco sobrou deste período como produção intelectual de cunho inovador. Tudo parecia transitório. A mudança para o Recife, em 1854, trará tempos, de todos os modos, mais áureos à instituição, com produção inovadora e intelectuais engajados com o país.

3. Faculdade de Direito de São Paulo

3.1. A Instituição

Institucionalizada simultaneamente com a Faculdade de Direito do Recife, no momento da aprovação da lei de 11 de agosto de 1827, a Faculdade de Direito de São Paulo tomou sede no Convento de São Francisco, construção do século XVII. Os motivos da escolha de São Paulo foram de ordem geográfica (perto do Porto de Santos, além de poder atender regiões sul e Minas Gerais), econômica (baixo custo de vida na cidade) e pelo clima ser moderado, ao estilo europeu.

A instalação de uma faculdade mudou a rotina da cidade, até então pacata e sem costume de grandes agitações. Casas de pensões abrigavam os estudantes que vinham de fora, alguns as chamavam de repúblicas.

Os profissionais desta escola eram autodidatas, abandonando a preocupação unicamente com a cultura jurídica, realizando produção em jornalismo, política, literatura e outros. Em meio a todo este progresso científico, abrem-se novas cadeiras no curso e produziu-se a primeira revista acadêmica oficial.

A Revista da Faculdade de Direito de São Paulo foi criada a partir do decreto número 1159 da reforma de Benjamin Constant, decreto este que estabelecia publicação anual de uma revista acadêmica nas escolas de ensino superior. Por São Paulo, ao contrário de Recife, esta idéia não soou como uma conquista, mas como um fardo a mais, uma tarefa a mais para a Faculdade. Os objetivos da revista eram voltados ao bom andamento interno da instituição, como se fosse um órgão interno a serviço da faculdade, e não como intercâmbio intelectual entre esta e outras instituições, não como bandeira ideológica da escola.

Além dela, outras publicações extra-oficiais circulavam pela faculdade; como jornais e revistas dos alunos, artigos em jornais municipais, etc., o que contribuía para uma ausência de maior prestígio para a revista. Os artigos mais publicados pela revista no período de 1890 a 1930 foram Direito Civil (32 publicações), a própria faculdade (26), Medicina Legal (21), Direito Criminal (20) e Filosofia do Direito (20). Pelo “tom introdutório e teórico” (p.177) dado aos artigos, eles mais pareciam aulas mestras do que artigos propriamente.

Outra conclusão a que se chega é que a revista da faculdade de São Paulo tem um caráter muito mais apagado que a do Recife, sem levantar bandeiras como a da antropologia criminal, sem trazer novas discussões polêmicas. Mais que isso ela incita uma auto-referência à cidade de São Paulo e ao curso de Direito. Diziam que o Direito era o que colocava o Brasil no rol dos países civilizados do mundo, e também que mais que uma profissão, o Direito era uma missão social.

Nos artigos de direito criminal, condena-se o determinismo racial da escola italiana apoiada pela faculdade do Recife. O que no Recife eram vanguardismo, em São Paulo era visto com cuidado, achavam ser exagero do cientificismo. Outro ponto interessante dos artigos da revista paulista era o apoio e legitimação dada por ela à nova república do Brasil. A vanguarda de São Paulo está assentada no apoio ao Estado liberal (conceito de liberal naquela época é diferente do conceito atual), um modelo de democracia evolucionista, porém ao mesmo tempo conservador no sentido que unia o conceito de liberdade com o de ordem, defendendo a centralização do Estado. Assim sendo, a Faculdade de Direito de São Paulo é um espelho da supremacia paulista na época da República Velha.


REFERÊNCIA

NASPOLINI, Rodrigo Benedet. In.: BuscaLegis.ccj.ufsc.br. Disponível em: <http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/29120-29138-1-PB.pdf>.

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