segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Tratados – Direito Internacional Público

Enviado por: Laura Pantoja Copstein
Autoria de: Charlene Ferreira da Silva e Mariana D'Eça Neves

Para iniciar um estudo sobre TRATADOS devemos antes de tudo conceituá-lo e para isso nada melhor que a Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 1969, no artigo 2º, inciso I, alínea a, que dita:

Tratados significa um acordo internacional concluído por escrito  entre Estados e regido pelo Direito Internacional, quer conste  de um instrumento único, quer de dois ou mais instrumentos  conexos, qualquer que seja a sua  denominação específica.( p. 223)

O termo “tratado” foi escolhido por essa Convenção como o mais adequado para que todos os convênios e acordos internacionais fossem mais simplificados e utilizados pelos países com eficácia.

Mas a validade de um tratado no plano do Direito Internacional não está atrelada obrigatoriamente à forma definida pela Convenção de Viena ou qualquer outra forma, o importante é que os países envolvidos, conforme entendimento da Comissão de Direito Internacional da ONU que as normas internacionais relativas à validade, eficácia, execução, interpretação e, mesmo, a extinção dos tratados sejam consideradas acordos.

Os contratos internacionais adquiriram, nos últimos anos, aceleração extraordinária, com a rapidez e a informalidade necessária para que os acordos sejam decididos.  A necessidade premente de se firmar acordos fez com que os tratados ficassem mais técnicos, pois há celeridade nas questões urgentes que a multiplicação de contatos entre Estados não cessa de criar, por isso a interpretação restritiva dos tratados, os instrumentos jurídicos em forma solene e os de forma simplificada.

Hoje não é necessariamente o Chefe do Poder Executivo que assina os tratados, há delegação para outras autoridades, para que os assinem e culminem nos acordos internacionais, as Constituições definem os níveis de competência para tal. Na Constituição Brasileira de 1988, no artigo 84, Inciso VIII, encontramos a seguinte explicação: Compete privativamente ao Presidente da República –VIII – celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional, portanto nas normas nacionais compete ao Presidente da República firmar acordos, mas antes deve receber a aprovação do Congresso Nacional – Câmara Federal e Senado. 

O Brasil utiliza as normas estabelecidas pela Convenção de Viena, mas o Congresso Nacional ainda não aprovou as normas regulamentares para tal.

É necessário procurar nos doutrinadores explicações maiores sobre os tratados no Brasil, onde encontramos as seguintes explicações: Cretella Junior, Pinto Ferreira, Amorim Araújo, todos concordam que realmente há necessidade da aprovação do Congresso Nacional. Pinto Ferreira diz, in MEDEIROS (1995): ... é necessária a aprovação dos acordos executivos  pelo Congresso Nacional, salvo emenda constitucional  que discipline a matéria, como na França (110- p. 384)

Outros ainda acham que alguns tratados simplificados não mereceriam a aprovação do Congresso, mas sempre com ressalvas de que não afete o patrimônio do Estado.

Desde a promulgação da nova Constituição Brasileira, em 5/10/88 até final de 1993 o Congresso Nacional apreciou 185 tratados internacionais submetidos pelo Presidente da República. Destes 55 mereceram aprovação simples do Legislativo, os restantes, 130, foram aprovados, mas com emendas estabelecendo novos ajustes celebrados em decorrência de tratados referendados, mereceriam também a aprovação dos Parlamentares, voltando, pois ao Congresso Nacional para a devida aprovação.

Casos já aconteceram, como por exemplo, em relação ao MERCOSUL em que o Brasil assinou Protocolo com a Argentina e não mereceu apreciação pelo Legislativo Federal.  O Protocolo no. 23, de 29/11/88 e vários anexos assinados em 22/08/89, por isso no Congresso Nacional o senador Silvio Name, discursando no Senado, protestou pelo Presidente da República haver assinado o protocolo e não ter pedido ao Congresso Nacional a permissão para tal.

Este Senador disse: É louvável que o Executivo se esforce por buscar a integração econômica dos povos da América do Sul, como estipula o artigo 4º, parágrafo único, da Constituição (p. 412) e continua: Mas não pode o Executivo, por outro lado, ignorar o dispositivo constitucional que determina a necessidade de aprovação legislativa para os tratados, acordos ou atos internacionais.(p.412in MEDEIROS). Muitos outros pronunciamentos na Câmara Federal foram feitos sobre o assunto.

Por ocasião do exame da Emenda no. 3 ao Convênio Constitutivo do Fundo Monetário Internacional (FMI) em 1993,  a Comissão de Relações Exteriores da Câmara  acatou parecer do deputado  Eduardo Siqueira Campos , referendando a emenda,  com a ressalva de que (In MEDEIROS) : São sujeitos à apreciação do Congresso Nacional  quaisquer revisões à presente Emenda, bem como quaisquer ajustes complementares que, nos termos do artigo 49, Inciso I ,da Constituição Federal, acarretam encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional (p. 421).

Os acordos de forma simplificada continuam sendo celebrados pelo Governo brasileiro, sem que vigência da Constituição o proíba, nada alterando o Itamaraty em relação a acordos simplificados como os de ajustes complementares, memorandos de entendimento, protocolos de intenções e muitos novos acordos.  A forma mais comum de celebração dos acordos em forma simplificada é a troca de notas diplomáticas, em que os pactuantes desdobram o acordo de vontades em textos produzidos no mesmo momento ou em momentos diferentes, cada um deles firmado em nome de uma das partes apenas.

Há um Manual de Procedimentos da Prática Diplomática Brasileira, -Atos Internacionais – de 1984, que continua sendo utilizado e diz que “os acordos por troca de notas versam sobre matéria secundária, de natureza administrativa” (p. 432 ibidem). Em vez de utilizarem o formal, instrumento inserido na C.F., utilizam a troca de notas diplomáticas e expressam a vontade, o acordo de vontades. 

Os acordos consistem em troca de notas diplomáticas de formato tradicional e podem ser  de duas modalidades: notas idênticas do mesmo teor e data ou então, uma nota de proposta e outra nota de aceitação , preferivelmente na mesma data.  Principalmente acordos de cooperação técnica, científica e cultural e tecnológicos é que são efetuados desta forma, informal.  Por exemplo, o acordo do Brasil com a Bolívia sobre Integração Energética firmado em 1989, e em 1993 sobre o Gás Boliviano. Um dos mais importantes é sobre o MERCOSUL, que acordos setoriais possam ser acordos simplificados, a fim de otimizar os recursos necessários e mobilidade eficiente dos fatores de produção.

As incertezas que cercam o processo de formação dos tratados no plano do Direito Interno Brasileiro conduzem ao surgimento de propostas para o Poder Legislativo regulamentar a matéria através de leis ou resoluções.

Ao referir-me acima que o Presidente da República pode delegar poderes aos Ministros para assinatura de tratados, a Medida Provisória no. 813, de 01/01/95, dispõe sobre a organização da Presidência da República e dos Ministérios, são assuntos que competem ao Ministério das Relações Exteriores: (in MEDEIROS) a política internacional e a participação nas negociações comerciais, econômicas, técnicas e culturais  com governos e entidades estrangeiras.(p.458) e no Decreto no. 99.578, de 1990, consolida normas sobre a organização e o funcionamento do Ministério das Relações Exteriores, estipula que compete ao Itamaraty: negociar e celebrar, com a cooperação de outros órgãos interessados, tratados, acordos e demais atos internacionais.(p.458)

Vemos então que o Ministério das Relações Exteriores é o órgão responsável pela assinatura de tratados, estabelecendo as relações diplomáticas que conduzem a acordos internacionais.

Para a celebração de tratados internacionais deve-se obedecer a algumas normas.  Há dois processos básicos. Um que é o processo solene e completo e que inicia com a negociação e a adoção do texto, prossegue com a avaliação interna, o aperfeiçoamento jurídico – internacional, e a incorporação do texto do tratado à ordem jurídica interna.(Congresso Nacional) a outra que pode ser utilizada é o envio ao Congresso Nacional do pedido de autorização para aderir ao tratado, concedida a autorização é remetido o instrumento de adesão à autoridade  depositária do tratado  que leva às partes o conhecimento, o Brasil poder aderir  e assumir as obrigações do tratado . 

O Processo simples e abreviado é o rito dos acordos simplificados que já colocamos em ordem anterior.

Até agora relatamos a legislação e a doutrina que se refere a tratados, principalmente quanto ao Brasil, que nos interessa circunstancialmente.  Mas o uso de terminologias como tratados e convenções, temos usado no decorrer da dissertação.

Mas temos que ter consciência que tratado e convenção são dois termos diferentes, com designação diversa.  Fomos ao Aurélio buscar o significado de cada termo e encontramos: Convenção – ajuste, combinação, o que se opõe ao que é por natureza, aquilo que tacitamente se acha admitido nas relações sociais; pacto - famosa assembléia francesa, (Bras) reunião de partido político, para deliberar sobre assunto de grande importância. – Tratado: Contrato internacional relativo a comércio, paz, etc; convênio; estudo  ou obra desenvolvida  acerca de uma ciência, arte, etc. 

Mas e o legislador brasileiro e o direito convencional que denominações utiliza?  A realidade mostra o uso livre, indiscriminado, e muitas vezes, ilógico, dos termos variantes, daquele que a comunidade universitária vem utilizando como termo-padrão. 

Usa-se acordo, ajuste, protocolo, carta, e tantos outros termos. Os compostos que irão determinar a natureza do texto convencional, quebrando assim a neutralidade do substantivo básico.

Todos são juridicamente utilizados, tratados se presta mais à livre designação de qualquer avença formal, entre sujeitos de direito das gentes e destinada a produzir efeitos jurídicos. Porém se falarmos: acordo de sede vê-se que é um contrato bilateral, internacional, e outras informações importantes. Já se utilizamos o termo compromisso arbitral, como utilizado no MERCOSUL, veremos que se trata de dois Estados que se submetem à arbitragem, certo litígio que os torna antagonistas. Os nomes compostos trazem uma orientação mais clara a que se refere o termo.

O tratado é um acordo formal, ele se exprime em determinado momento histórico e seu teor deve ser bem definido. Deve ter a forma escrita, do feitio documental, e deve estar concluído, estar perfeitamente acabado. Se não houver a conclusão não se considera tratado, mas sim um projeto. 

A produção de efeitos de direito é essencial ao tratado, deve haver o animus contrahendi, acordo de vontades de criar vínculos obrigacionais, e deve ser visto como ato jurídico que produz a norma, desencadeando direitos, obrigações e prerrogativas que caracteriza o tratado internacional.

Retornando ao assunto, Convenção de Viena, os redatores do Tratado dizem que este tratado é um compromisso celebrado por escrito entre Estados e regido pelo Direito Internacional.

Acordo Executivo é expressão criada nos Estados Unidos para designar aquele tratado que se conclui sob a autoridade do chefe do Poder Executivo, independentemente do parecer e consentimento do Senado. Um tratado de forma simples, concluído e posto em imediato vigor pela assinatura das partes no instrumento único, ou por troca de notas, não se confundirá com um acordo executivo se os governos pactuantes estiverem agindo com apoio em aprovação parlamentar prévia.  Há uma subjetividade nesta relação.

Há uma distinção também entre tratados contratuais e tratados normativos. Kelsen (inREZEK(1996)  diz o autor  sobre sua  crítica:  A crítica de Hans Kelsen a essa distinção classificatória é fulminante. Parece-lhe que tanto no tratado chamado contratual quanto naquele dito  normativo, a vontade convencional das partes  tem sempre um mesmíssimo objeto, constituído pela  integralidade do teor  do tratado(p.30). Kelsen  trata como pleonasmo  a expressão tratados normativos, para ele os dois são iguais.

Na classificação ainda nos tratados, temos que observar o tempo, tempo de execução do tratado, se objetiva uma situação jurídica estática, objetiva e definitiva ou uma relação jurídica dinâmica, que se estabelece em função de vincular as partes por prazo certo ou indefinido. O exemplo clássico da primeira espécie é o tratado das fronteiras, do tratado de limites, que é definitivo, pelo qual dois Estados definem a linha divisória dos seus territórios. Aí podemos enquadrar os tratados pertinentes à cessão territorial.  Dinâmicos são os restantes dos tratados internacionais.

Já verificamos que a competência negocial é do Poder Executivo dos Estados, no Brasil, com afirmação do Poder Legislativo.  Mas a representatividade exterior do Estado é matéria de direito internacional, e seu representante é o chefe de Estado.  Ela é originária, mas temos a derivada, que, como vimos, pode ser delegada a um mandatário, no caso o Ministro das Relações Exteriores. Mas ainda temos os poderes dos Embaixadores, que é chefe da missão diplomático no exterior, encarregado das negociações de contratos bilaterais. Ele recebe a carta de plenos poderes, que é a credencial específica para o encargo negocial.

Quanto à língua que o tratado deva ser registrado, poderá ser nas dos dois países, ou então numa terceira, que maior comodidade ofereça, de consenso das partes.

Para se elaborar um tratado há o texto convencional que merece receber uma estrutura, partindo do Preâmbulo em que enuncia o rol das partes pactuantes e dos motivos e circunstancias do ato convencional, seguido da parte dispositiva que é a parte essencial do tratado, lavrado em linguagem jurídica, tem o feitio de normas, ordenadas e numeradas como artigos ou mesmo, como cláusulas. Os anexos fazem parte do tratado, e constituem teor compromissivo do tratado.

É inconcebível que uma norma jurídica se imponha ao Estado soberano à sua revelia. Para todo Estado, o direito das gentes é o acervo normativo que, no plano internacional, tenha feito objeto de seu consentimento. Por isso o Legislativo é um fator preponderante no Direito dos Tratados.

No Brasil, é ostensivo, tudo que compõe o ordenamento jurídico presume publicidade oficial e vestibular.  Um tratado regularmente concluído depende de publicidade para integrar o acervo normativo nacional, habilitando-se ao cumprimento por particulares e governantes, e á garantia de vigência pelo judiciário.  No Brasil se promulgam, por decreto do Presidente da República, todos os tratados que tenham feito objeto de aprovação congressional e publica-se no Diário Oficial da União, garante a introdução no ordenamento jurídico nacional dos acordos.

Interpretar o tratado internacional significa determinar o exato sentido da norma jurídica expressa num texto obscuro, impreciso, contraditório, incompleto ou ambíguo.  Deve-se interpretar o que não está claro, não é óbvio.  Para se realizar a interpretação, deve-se observar se no plano internacional, a voz do governo, é autêntica, e essa interpretação autêntica pode tomar a forma de um novo acordo, de índole puramente interpretativa, um exemplo, é o Tratado de Cooperação Amazônica assinado em 1980 pelos chanceles dos Estados partes.

A interpretação no plano internacional diz-se jurisdicional, quando provida por organismo vestido, ainda que ad hoc, do poder de jurisdição, no exame do litígio concreto entre sujeitos de direito das gentes. Por exemplo, a Corte de Haia.

Um tratado pode ser extinto por ab-rogação, quando as partes dão por ele terminado, deixando estas de serem obrigadas. Todo tratado com termo cronológico de vigência encerra uma forma de predeterminação ab-rogatória pelas partes pactuantes.  Pode haver a condição resolutiva com o perecimento automático das convenções, com todos os atos de execução do pacto concluídos, podendo também se dar a extinção através de ato unilateral.

A renúncia é um ato unilateral de efeito jurídico inverso que produz duas figuras: o Estado manifesta sua vontade de deixar de ser parte no acordo internacional. A todo o momento pode assumir, perante compromissos internacionais, essa postura, mas para isso deve haver o pré-aviso, com um prazo, e após ele renuncia o tratado.

A renúncia se faz por escrito numa notificação, carta ou instrumento e significa vontade de romper o compromisso. No Brasil, em 1926, o Presidente da República propôs se desligar da Sociedade das Nações, para isso o consultor jurídico do Itamaraty, Clóvis Bevilaqua foi chamado a opinar sobre a competência do governo, e, em parecer, o professor jurisconsulto o expôs.

Da impossibilidade do cumprimento do tratado ou ainda à alteração fundamental das circunstâncias (teoria da cláusula rebus sic stantibus): a Convenção de Viena dá o direito de liberar o Estado do compromisso.  E também prescreve que a mudança fundamental das circunstâncias não pode ser invocada para que o pactuante dispense de cumprir o tratado, a menos que apresente os requisitos arrolados para invocar o princípio rebus sic stantibus (estado em que se encontre).

Deve haver a condição essencial do consentimento e deve-se mostrar fundamental a mudança nessa circunstância, conforme a dimensão e o valor qualitativo. Deve também essa mudança circunstancial reputar-se imprevisível.

Portanto, ao estudar no Direito Internacional público os tratados, parte fundamental do direito das gentes, como as partes negociam, como se pactuam e quais os compromissos internacionais que criam, vemos que a celebração de textos negociais fazem parte de nosso cotidiano. 

Com o MERCOSUL está o Brasil em constantes tratativas com os demais países, e entender como funciona deve fazer parte de nossas vidas, como cidadãos e, mais ainda, como estudantes de Direito Internacional Público.


REFERÊNCIA

SILVA, Charlene Ferreira da; NEVES, Mariana D'Eça. Tratados (Direito Internacional Público). Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=4064>.

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