terça-feira, 29 de setembro de 2015

Direito no Brasil Colonial

Enviado por: Alice de Los Angeles
Autoria de: Paulo Roberto Rocha de Jesus

1. Explicação Geral

O Brasil, quando descoberto, já estava inserido num acordo com efeitos jurídicos, realizado entre Espanha e Portugal. Este último foi o que obteve a maior parte do território, sendo o responsável pelo desenvolvimento e pelo início do uso do direito moderno na Colônia.

Antes da chegada dos portugueses, os índios seguiam os costumes adotados pela tribo da qual faziam parte. Qualquer forma de relação ou organização social, divisão de tarefas entre seus membros, estava de acordo com as práticas e com as tradições religiosas locais. Portugal teve que interferir na vida indígena, para que assim concretizasse seu objetivo, que era o de auferir lucros com a Colônia, por meio de um comércio monopolizado e totalmente dedicado aos interesses da elite portuguesa na Europa.

O direito utilizado na metrópole teve como influência o direito romano. Este foi estudado pelos juristas da Idade Média, chamados glosadores, que aditavam comentários aos textos encontrados, adaptando-os à realidade medieval na Europa. Esse direito, da forma que era aplicado em Portugal, foi trazido para o Brasil, na sua completude, sem sofrer alterações e adaptações, comprometendo assim a realização da justiça e a organização da sociedade, já que a situação em que se encontrava a Colônia não era própria para a recepção de um direito já consolidado em outro contexto social e político.

Os detentores do poder na Colônia eram os donatários, os senhores de escravos e os proprietários de terras. Eles seguiam os interesses da Coroa Portuguesa, que na época ainda era um Estado absolutista. A forma com que seria realizada a administração do território brasileiro e suas atividades produtivas tinha que atender aos desejos da nobreza lusitana. O direito nacional foi construído sem haver o respeito à população nativa e aos negros, que compunham a maior parte do povo. Foi imposta uma legislação alienígena onde não existiam condições de ela funcionar corretamente. Isso comprometeu toda a evolução do direito no Brasil, criando diversos problemas ao longo dos anos que iriam exigir mudanças em pontos cruciais de sua organização política.

2. Ideologia Lusitana no Período Colonial do Brasil

Um importante fator que interferiu fortemente no direito do Brasil-Colônia foi a concepção ideológica de Portugal, que estava de acordo com o pensamento da Igreja, logo após a contra-reforma. O Estado lusitano rejeitou as idéias da Reforma Protestante e iniciou a instalação de tribunais da Inquisição em seu território e em suas colônias. Como todo o sistema jurídico estava sendo trazido para o Brasil, aqui também houve a atuação da Inquisição, porém de forma diversa. Os agentes inquisitoriais (escolhidos pelas autoridades eclesiásticas na Europa e vindos de lá para cá através das navegações) faziam seus trabalhos no território brasileiro e procediam à prisão das pessoas que eram acusadas de heresia. Essas pessoas recebiam a sentença do Tribunal do Santo Ofício de Lisboa, mas cumpriam a pena no Brasil. Vê-se então a participação do direito canônico na construção do direito brasileiro e na sociedade, como norteador nas ações relativas à religião, e como peça para a concretização dos interesses da elite metropolitana.

A Península Ibérica se distanciou dos demais países quando optou por defender a Igreja Católica. Enquanto países como a Inglaterra, França, Alemanha, se desenvolviam com as idéias do Renascimento, aceitando o que era proposto por pensadores como Galileu Galilei e Copérnico, Portugal permanecia estático, sem inovações, tudo devido às proibições eclesiásticas, que influíam em diversos setores da sociedade, impedindo o avanço tecnológico. Portugal tinha a seu favor apenas as vantagens obtidas com as descobertas no período das grandes navegações. Esse atraso sofrido pelo Estado lusitano fez com que ele precisasse mudar seus métodos, para que conseguisse manter a posição e gerar mais lucros.

Foram principalmente as reformas do Marquês de Pombal, realizadas em consonância com as idéias do Iluminismo, que modificaram o panorama português. Essas reformas diminuíram o poder da Igreja na sociedade, por meio de algumas medidas, como por exemplo a expulsão dos jesuítas de Portugal, em 1759. Também incentivaram o desenvolvimento tecnológico e a modernização do sistema de ensino, passando o controle educacional para o Estado (anteriormente era a Igreja quem administrava o ensino superior). Outra reforma foi a redução dos privilégios da nobreza, tendo-se em contrapartida um aumento nas condições de atividade mercantil dos burgueses. Essas alterações ocorridas em Portugal foram sentidas no Brasil, que era um receptor direto da cultura e do modelo jurídico português.

3. Legislação no Brasil-Colônia

A legislação utilizada no Brasil veio totalmente de Portugal, sem a participação dos negros e dos índios. O direito lusitano se sobrepôs às regras que regiam a vida dos nativos e dos africanos. Estes passaram da condição de agentes para pacientes do direito, sendo apenas uma categoria de seres vivos que geram efeitos jurídicos e, portanto, devem ser regulado pelo Direito moderno. Eles não possuíam poderes, apesar de representarem a massa populacional da Colônia.

Portugal possuía compilações que reuniam os costumes e as leis vigentes na época. Primeiramente vigoraram as Ordenações Afonsinas (1446), passando para as Ordenações Manuelinas (1521) e logo após para as Ordenações Filipinas (1603). Elas eram chamadas de Ordenações do Reino e o que se podia notar na passagem de uma para a outra era a presença de poucos acréscimos em seu texto, ou seja, elas correspondiam a compilações das anteriores, sendo apenas adicionados alguns dispositivos.
No Brasil, essas ordenações vigoraram principalmente após a instalação do sistema de governos-gerais. Não houve adequação do direito lusitano que aqui foi aplicado, isso gerou vários conflitos e problemas que não encontraram soluções na legislação, exigindo-se a criação de novas normas. Estas foram chamadas de “Leis Extravagantes” e supriam a omissão legal versando sobre diversas matérias, sendo mais destacado o direito comercial.

Com as reformas pombalinas, surgiu a Lei da Boa Razão, que limitava o uso do direito romano e trazia preceitos que deveriam ser observados na interpretação das normas, quando se quisesse resolver algum caso não tratado na legislação. Essa lei tinha como objetivo o fortalecimento do poder real no controle da Colônia, já que os aplicadores do direito tiveram uma maior liberdade para julgar os casos de acordo com os interesses políticos e econômicos da Metrópole.

4. Organização da Justiça

Os aplicadores da justiça no Brasil, durante o seu desenvolvimento, não foram os mesmos. Alguns fatores contribuíram para a evolução do sistema judiciário, ampliando o número de funcionários e tornando mais práticos os processos.

No início da colonização do Brasil, quando a administração política seguia o modelo das capitanias hereditárias e era competência dos donatários, estes possuíam amplos poderes para julgar e condenar quem desrespeitasse suas regras, que estavam de acordo com o direito lusitano. Eles possuíam o direito sobre a terra, que lhes foi dado por meio das cartas de doação, e por esse motivo eram os administradores, chefes militares e juízes no espaço de suas capitanias. Julgavam civil e criminalmente qualquer infrator da norma, podendo delegar suas funções para um ouvidor, meirinho, escrivão ou tabelião.

Quando a administração do território mudou para o sistema de governos-gerais, os ouvidores ganharam um papel maior na organização política brasileira. Portugal queria uma colônia que atendesse fielmente aos seus interesses. Para isso, era necessário que houvesse uma jurisdição mais atuante, fazendo valer os preceitos e normas lusitanas nos casos conflitantes que surgissem. Os denominados ouvidores passaram a ser ouvidores-gerais, possuindo maiores funções e responsabilidades e tomando aos poucos o lugar dos donatários como operadores da justiça. O governador-geral administrava e o ouvidor-geral cuidava das contendas e demais situações que exigiam interferência da legislação lusitana, tendo um poder quase discricionário para decidir os casos.

Com o tempo, surgiram necessidades que exigiram o aumento do número de funcionários para que fossem atendidas. Os ouvidores-gerais não poderiam realizar sozinhos todas as funções jurídicas. A organização judiciária passou a ter um maior número de agentes, e houve uma divisão para que melhor se realizassem as tarefas. Na primeira instância havia os juízes singulares, que eram os ouvidores, os juízes ordinários e os juízes especiais, responsáveis por julgar os casos e dar a primeira sentença relativa a eles. A segunda instância era composta por tribunais colegiados, os Tribunais de Relação, onde eram julgados os recursos interpostos pela parte perdedora, tendo-se ao final do processo o acórdão emitido pelo grupo de magistrados, chamados desembargadores. Na terceira instância tinha-se a Casa da Suplicação, que representava o Tribunal de Justiça Superior, com sede em Portugal.

Os juízes ordinários, também chamados de juízes da terra (devido ao fato de serem escolhidos entre os homens de melhor reputação), atuavam em conflitos de matéria civil e penal, podendo ser a ele competido as atribuições de juiz de órfãos, quando não houvesse um na região. Também julgavam causas relativas aos nobres, ou a situações de injúrias verbais. Os juízes singulares se classificavam em: juiz de vintena, que julgavam pequenas causas, exceto as que envolvessem bens imóveis; juiz de órfãos, responsável pelas causas relativas ao direito de sucessão (como hoje é conhecido), bem como as que envolvessem menores de idade e os processos de curatela e tutela; juiz de fora, que cuidava de causas cíveis envolvendo bens móveis com valor de até 600 réis e bens imóveis com valor de até 400 réis.

5. Domínio Holandês

Durante o período da União Ibérica (Portugal e Espanha sob o mesmo reinado) os Holandeses participavam de diversos conflitos, tentando se emancipar da Espanha. Quando alcançado o objetivo, eles se organizaram na República das Províncias Unidas, mas foram impedidos de comercializar com os portos espanhóis, por ordem de Filipe II (que governava a União Ibérica). Com isso, a economia holandesa foi abalada fortemente, já que ela tinha como importante fonte de lucros os negócios realizados em torno do açúcar que era produzido no Brasil.

Para contornar a situação, a Holanda partiu para o comércio com o Oriente, criando a Companhia das Índias Orientais como órgão regulamentador dos negócios efetuados. Diante do sucesso obtido, criaram também a Companhia das Índias Ocidentais, para regular o comércio realizado com as Américas, estabelecendo um monopólio em tal relação. Eles desejavam auferir lucros com o comércio direto com o Brasil, exportando o açúcar que aqui era produzido. Para isso, tentaram dominar parte do território brasileiro, correspondente à Bahia, mas foram rechaçados por tropas que já haviam recebido ordens da metrópole para impedir a dominação holandesa.

Uma nova tentativa foi realizada, e nessa o resultado foi diferente. Os holandeses invadiram Pernambuco, e lá estabeleceram um governo, que exigia até pagamento de impostos pelos moradores brasileiros. Esse governo teve como principal atuante o Conde Maurício de Nassau, que trouxe reformas econômicas e uma certa organização para o local.

A estrutura de governo que aqui foi implantada seguia a holandesa, tendo-se até órgãos semelhantes aos da Holanda, como os Conselhos de Escabinos, no âmbito municipal. Esses conselhos possuíam um membro com poderes de polícia e de administração, o escolteto. O direito que se conhece da época é escasso, mas sabe-se que na área penal as pessoas poderiam receber pena de morte caso estivessem opondo algum tipo de resistência ao domínio holandês. Poderiam ser esquartejadas, enforcadas, mortas com torturas ou na fogueira, etc. Crimes de outra natureza recebiam penas mais leves, como açoites, multas, prisões, entre outras.

6. Entradas e Bandeiras

Durante a colonização do território brasileiro, mais precisamente a partir do século XVII, houve a ocorrência das denominadas entradas e bandeiras. Nessa época, Portugal vivia uma crise por conta da pressão espanhola, e para que a superasse, investiu na ampliação da área de colonização do Brasil, dando início aos fenômenos tratados anteriormente.

Esses movimentos consistiam na penetração do mapa nacional, o qual dessa forma, desrespeitaria os limites impostos pelo Tratado de Tordesilhas assinado com a Espanha. Alguns objetivos foram traçados, dentre os quais o aprisionamento de índios e a busca por pedras preciosas e drogas do sertão, sendo estes últimos os principais. As entradas diferiam das bandeiras, pois eram organizadas pela Coroa Portuguesa, já as outras, envolviam interesse de particulares.

Com o desenvolvimento das entradas e bandeiras, muitos índios foram capturados. Nessa época, ocorriam as missões jesuítas, que realizavam a catequização dos índios, acreditando-se que eles teriam suas almas salvas caso se convertessem para a religião católica. Percebe-se então que o movimento de entradas e bandeiras acabou atrapalhando a função dos jesuítas, e um clima de discórdia foi estabelecido entre ambos.

Na área do Bandeirantismo algumas modalidades foram criadas. A primeira se diz ao fato da captura de índios, é a denominada apresadora. Já a segunda é a prospectora, onde o principal objetivo era a busca por pedras preciosas, mas que também, de forma indireta, visava ao aprisionamento de nativos. A terceira modalidade de bandeiras é a contratual, que significa a contratação de bandeirantes pela Coroa Portuguesa ou por donos de engenhos de açúcar para efetivar a detenção de escravos africanos que se evadiam de suas funções.

7. Ciclo da Mineração

Após as descobertas das fontes de minério no interior brasileiro e com a pouca lucratividade dos negócios envolventes com o cultivo da cana-de-açúcar, Portugal passa a empreender, visando a um melhor retorno, no âmbito minerador. Com o decorrer dessa investida, a Coroa Portuguesa passa a cobrar o quinto, que era baseado no imposto cobrado nas casas de fundição, o qual correspondia a 20% do ouro em questão.

Uma grande corrida na busca de metais preciosos, como o ouro e a prata, foi deflagrada. Contudo, a maior parte das extrações ficou nas mãos dos grandes proprietários de terras e comerciantes, os quais exigiam um grande conjunto de investimentos em mão-de-obra e aquisições de equipamentos. Os principais lugares de extrações foram Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso. Além do quinto cobrado, outra forma de lucrar com a mineração foi a derrama, que consistia no envio de 1500 kg de ouro a Portugal anualmente.


REFERÊNCIA

JESUS, Paulo Roberto Rocha de. O Direito no Brasil-Colônia. 2011. Disponível em: <http://www.artigojus.com.br/2011/07/o-direito-no-brasil-colonia.html>. Acesso em: 28.09.2015.

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